Quinta-feira, 10 de Dezembro de 2015

A Bomba Verde de Américo Nunes

 

A Bomba Verde de Américo Nunes

"O Senhor Porsche",

Presente em Vila Real em:

1969

Américo Nunes-Evaristo Saraiva Porsche 911S

1970

Américo da Silva Nunes               Porsche 911ST que ainda me lembro de a ver junto á cervejaria Gomes 

1971

Américo da Silva Nunes               Porsche Carrera 6

1972

Américo da Silva Nunes               Porsche Carrera 6

 

 

1394783_590732287650476_964570059_n.jpg

 À memória de Américo Nunes, deixamos-lhe agora o nosso ensaio à Bomba Verde, publicado na edição de outubro de 2013 da revista TURBO.

1377090_587489374641434_118316643_n.jpg

A Bomba Verde de Américo Nunes

O melhor amigo do Homem

 

image_14115_0_1449766887.jpeg

Este era, na sua época, o carro mais impressionante que se podia ver numa prova de estrada nacional. Foi o próprio multicampeão Américo Nunes que o foi buscar a Estugarda. Já era verde e o piloto transformou-o na sua bomba

 

 

O Porsche 911 é um carro omnipresente na história do automobilismo nacional. E neste contexto a sua imagem está literalmente colada ao rico palmarés do piloto lisboeta Américo Nunes. Ao longo dos seus 20 anos de carreira desportiva (entre os anos 60 e 80), com grande fidelidade aos carros da casa de Estugarda, teve muitos Porsche, mas este 911 ST é a sua imagem de marca. Não é o carro que mais vitórias lhe deu, mas foi, pela sua pujança e sonoridade, o que fez mais furor nas provas da época e que era provavelmente o carro mais potente que os aficionados poderiam ver nas mãos de um piloto nacional.

 

Porque ainda há quem, por pura paixão, decida recuperar e manter carros que fazem a história do nosso automobilismo, o “bomba verde” está bem e recomenda-se. Encontrámo-lo muito perto de nós, nos arredores de Lisboa, num estado de preservação de fazer inveja a muitos carros de museu. Com alguns elementos modernos que o desviam da originalidade mas que lhe garantem as condições de segurança e homologação necessárias para que se mantenha no ativo, o Porsche 911 ST com a matrícula LH-36-76 provavelmente ainda esconde algures uma impressão digital de Américo Nunes, que o comprou em 1970.

image_14115_0_1449766939.jpeg

Continua verde, continua pujante, bem preservado e com uma voz de trovão a emanar das duas cornetas negras de escape, responsável pela parte “bomba” da alcunha e que mais parecem os canos de uma metralhadora pesada. São uma espécie de garganta dupla do belíssimo boxer com duas velas por cilindro, a ostentar no topo mais duas filas de três cornetas, estas de admissão, bem espetadas para o alto e com um cromado reluzente que fica bem em qualquer fotografia, mas que de tão abertas dão pena quando pensamos que toda a poeira e terra que saltasse da estrada seria profundamente inspirada pelo nobre boxer, já que a única coisa que se interpõe entre as goelas de admissão e o meio ambiente é a rede da tampa do motor... Era assim no passado, porque o importante mesmo era andar para a frente e depressa e nem o Américo aceitaria outra coisa que não o máximo que a bomba pudesse dar.

image_14115_0_1449766956.jpeg

Ele exigia tudo aos seus Porsche, mas respeitava-os. Tal como nos disse da última vez que estivemos ao seu lado dentro de um Cayman em 1997: “Os Porsche são os melhores amigos do Homem. Mas não admitem erros!”

 

O “Bomba Verde” foi construído pelo próprio departamento de competição da marca alemã, em Estugarda, com a competição como objetivo. Ainda assim, este exemplar não nasceu uma bomba, já que foi entregue ao piloto português com especificações de circuito, com os 240 CV de potencia a surgirem apenas nos regimes mais elevados de rotação (às 7800 rpm), suspensões e barras estabilizadoras demasiado firmes e relações de caixa pouco apropriadas para os ralis. O carro estava portanto difícil de guiar em estrada, revelando uma forte tendência para soltar a traseira. Américo Nunes sentiu tudo isso ao trazê-lo de Estugarda para Lisboa e não apreciava este “setting”, começando de imediato a afinar o carro a seu gosto, como tinha o hábito de fazer a todos os seus bólides de competição, arte que bem dominava. No motor tentava sempre manter as especificações de fábrica por respeito à fiabilidade, mas acreditava que uma suspensão demasiado dura castigava a integridade estrutural do carro.

Contra todas as previsões, Américo Nunes venceu o Campeonato nacional de Ralis no primeiro ano em que correu com este ST, mesmo antes de ter terminado as alterações que considerava necessárias. Havia qualquer coisa nele que lhe permitia, de facto, “falar” com os Porsche, desde muito jovem.

image_14115_0_1449766974.jpeg

De aprendiz a campeão

Ao contrário do que acontecia com alguns dos seus adversários, as origens humildes de Américo Nunes obrigaram-no a conquistar a sua carreira a pulso. Começou a trabalhar em 1939, aos 11 anos de idade, como aprendiz de bate-chapa. O trabalho era duro mas a paixão pelos carros, que nascera com ele, tornava tudo mais fácil. O seu profissionalismo abriu-lhe as portas da Guérin, importadora da Volkswagen e Porsche na altura, onde aprendeu a reparar e modificar os carros da marca com uma destreza invulgar. Em 1962 o seu talento deu frutos de forma inesperada: o diretor da empresa, José Duarte Ramos Jorge, danificou seriamente o seu 356A num acidente. O jovem Américo decidiu comprar-lhe o carro a prestações, recuperou-o e alinhou com ele no Rali de Fim de Ano de 1962, começando assim uma carreira desportiva que resultaria em seis títulos nacionais e 183 vitórias, entre provas de velocidade e ralis. Depois da segunda prestação de cinco contos, Ramos Jorge decidiu oferecer-lhe o carro.

image_14115_0_1449766991.jpeg

Os Porsche 911 entraram na vida do piloto em 1967, passando a ser os seus carros de competição mas também do dia-a-dia. Naquele ano comprou um vermelho para os ralis (matrícula GL-61-22) e outro amarelo (matrícula GL-96-60) para as provas de velocidade. Ganhou ambos os campeonatos. No ano seguinte chegou o 911S branco (BG-34-18) que lhe daria algumas vitórias nos ralis mas que não conseguiria competir com os Lotus 47 e os Ford GT40 no Campeonato Nacional de Velocidade. O seguinte seria o “Bomba Verde”. Com ele Américo Nunes chegou a participar no Rali de Monte Carlo de 1972.

image_14115_0_1449767011.jpeg

Bomba sempre verde

Com as especificações do S puxadas até novos limites e o peso do base de gama T, o histórico 911 ST verde teve vários proprietários depois dos seus momentos áureos nas mãos do piloto, mas só recentemente recebeu os cuidados que merecia. Teve direito a um motor totalmente renovado e mistura agora a aura do passado com as exigências de segurança ditadas pela atualidade. É por isso que nele encontramos uma moderna bacquet desportiva e um painel de instrumentos mais completo do que o original, com a inevitável “roll bar”, tudo isto a contrastar com um habitáculo totalmente descascado de qualquer revestimento ou elemento de conforto. É graças a estes elementos de segurança que o “Bomba Verde” se mantém vivo, continuando a participar, pelo menos, numa prova por ano, contando recentemente com uma participação no Le Mans Classic, outra em Nurburgring, no Tour Britania e mais recentemente na Volta à Espanha de 2012.

image_14115_0_1449767032.jpeg

As enormes rodas com jantes Fuchs no eixo dianteiro e Minilite no traseiro são a imagem do processo de restauro infindável em que um carro histórico sempre se encontra (as Fuchs do eixo traseiro estavam a retificar), embora nenhuma delas fuja ao rigor histórico, já que Américo Nunes correu com ambos os tipos de jantes. De resto, desde o motor à caixa de velocidades com a primeira para trás, passando pelos pedais, volante e chassis, estamos perante o autentico companheiro de batalha do grande Américo. Um valioso pedaço da nossa história automobilística que não podia estar mais vivo. Agora definitivamente, a Bomba Verde está de volta.

image_14115_0_1449767051.jpeg

Curiosidades do Américo e do carro:

 

-Quando participou na sua primeira prova, o Rali de Fim de Ano de 1962, Americo Nunes já tinha 32 anos de idade

 

-Em 1970 o Bomba Verde estreou-se na rampa de Monsanto, onde obteve o sexto lugar da geral. Ostentava ainda a matrícula provisória alemã de exportação (428 Z-9361), pois tinha acabado de vir de Estugarda, conduzido pelo próprio Américo Nunes. Tinha especificações de pista e não era ainda uma “bomba”.

 

-O verde era a pintura original do carro e Américo Nunes só o soube quando o foi buscar à Alemanha. A tonalidade verde dos seus carros é, de facto, uma mera coincidência na sua carreira. A faixa do 356 B Carrera resultou de um resto de tinta que havia na Guérin, tonalidade que, por motivos óbvios, não tinha grande saída comercial. O verde de Américo Nunes devia-se a motivos meramente orçamentais.

 

-No nevoeiro, Nunes instalava faróis a menos de um palmo do chão para iluminar por baixo da neblina, retirava a pala do capacete, encostava a cara ao para-brisas e acelerava a fundo.

 

-Embora trabalhasse na Guérin, a importadora da Porsche não apoiava diretamente a carreira desportiva de Américo Nunes no início da sua carreira. Mais tarde, perante os seus resultados passou a fazer-lhe descontos nas peças e a “esquecer” uma ou outra conta da revisão do 911.

 

-No início dos anos 70 a “English Leather” patrocinou o piloto português. Um patrocinador angariado por um amigo e que o piloto nunca soube exatamente de quem se tratava…

 

-Em 1972 a Bomba Verde foi disputar o Rali de Monte Carlo. O carro não estava bem adaptado às condições do piso. O resultado foi fraco.

 

-Américo Nunes acreditava na fiabilidade original dos Porsche, por isso raramente lhes alterava os motores. Apenas modificava as relações de caixa e lhes retirava todo o peso que podia. O piloto acreditava também que as suspensões muito duras reduziam a durabilidade do carro.

 

-- Enquanto Campeão nacional de Velocidade, em 1973, Américo Nunes foi convidado para correr no VII Circuito Automobilístico de Moçamedes. Atrasou-se para o avião e foi dado o aviso à tripulação de que o “senhor Américo” estava atrasado. Esta interpretou mal o recado e avisou os passageiros de que “o presidente Américo Tomás” também ia no voo mas estava atrasado. Quando Américo Nunes embarcou os passageiros não tiveram a reação mais calorosa.

 

Texto: António Amorim;

Fotos: José Bispo (foto de Américo Nunes) e Vasco Estrelado (fotos da Bomba verde)

In
http://turbo.sapo.pt/ultimas/artigo/americo-nunes-1928-2015-14115.html?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook

 

 


publicado por dinis às 22:33
link do post | comentar | favorito

.mais sobre mim

.pesquisar

 

.Maio 2025

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3

4
5
6
7
8
9

15
16

19
20
21
22
23
24

25
26
27
28
29
30
31


.Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

.posts recentes

. Rali de Portugal 2025 Fig...

. Alfa Romeo TZ - Um olhar ...

. Porsche 911 Carrera RSR 2...

. Rali de Portugal 2025 Fig...

. Peugeot 203 Lyon - Um olh...

. 54º Circuito Internaciona...

. Ford Thunderbird 1961  - ...

. Gatethering supercars 202...

. Yamaha YZR 500cc 2001 Nor...

. BMC Cooper S 1965 Vencedo...

. O circuito dos 100 anos

. 187º Encontro de Clássico...

. Seat Cordoba WRC - Um olh...

. Porsche 911 Carrera Cabri...

. Renault AG1 Táxi - Um olh...

. Bugatti T 41 Royale - Um ...

. Honda RVF 750cc 1985 Joey...

. Gatethering supercars 202...

. Aston Martin DBR - Um olh...

. BMW M 3 - Um olhar sobre ...

. 187º Encontro de Clássico...

. Gatethering supercars 202...

. Porsche 911S 2.4 1971- Um...

. Fiat 600 Multipla - Um ol...

. Studebaker Silver Hawk - ...

. Gatethering supercars 202...

. Yamaha YZR 500 CC 1999  -...

. Citroen DS 21  - Um olhar...

. Gatethering supercars 202...

. Toyota Corolla - Um olhar...

. Porsche 911 SC Cabriolet ...

. Gathering supercars 2025 ...

. Mercedes-Benz 200D  - Um ...

. Porsche 928 GT - Um olhar...

. Honda NS 500 cc 1984 Rand...

. Fiat 131 Abarth - Um olha...

. Skoda Octavia WRC  2003- ...

.  Porsche 365 A Carrera Sp...

. Encontro com a arte 

. Citroen Traction 11 Madri...

. Ford V8 1936 - Um olhar s...

. Gathering Supercars 26 e...

. Honda RC 162 1961 Grandes...

. Bentley EXP Speed 8 2001 ...

. 186º Encontro de Clássico...

. Porsche 911 Carrera RS 19...

. Porsche 959 - Um olhar so...

. Volkswagen Beetle Rio de ...

. Bugatti 57 Atalante 1939 ...

. Aprilia RSV 1999 CC 2002 ...

.arquivos

. Maio 2025

. Abril 2025

. Março 2025

. Fevereiro 2025

. Janeiro 2025

. Dezembro 2024

. Novembro 2024

. Outubro 2024

. Setembro 2024

. Agosto 2024

. Julho 2024

. Junho 2024

. Maio 2024

. Abril 2024

. Março 2024

. Fevereiro 2024

. Janeiro 2024

. Dezembro 2023

. Novembro 2023

. Outubro 2023

. Setembro 2023

. Agosto 2023

. Julho 2023

. Junho 2023

. Maio 2023

. Abril 2023

. Março 2023

. Fevereiro 2023

. Janeiro 2023

. Dezembro 2022

. Novembro 2022

. Outubro 2022

. Setembro 2022

. Agosto 2022

. Julho 2022

. Junho 2022

. Maio 2022

. Abril 2022

. Março 2022

. Fevereiro 2022

. Janeiro 2022

. Dezembro 2021

. Novembro 2021

. Outubro 2021

. Setembro 2021

. Agosto 2021

. Julho 2021

. Junho 2021

. Maio 2021

. Abril 2021

. Março 2021

. Fevereiro 2021

. Janeiro 2021

. Dezembro 2020

. Novembro 2020

. Outubro 2020

. Setembro 2020

. Agosto 2020

. Julho 2020

. Junho 2020

. Maio 2020

. Abril 2020

. Março 2020

. Fevereiro 2020

. Janeiro 2020

. Dezembro 2019

. Novembro 2019

. Outubro 2019

. Setembro 2019

. Agosto 2019

. Julho 2019

. Junho 2019

. Maio 2019

. Abril 2019

. Março 2019

. Fevereiro 2019

. Janeiro 2019

. Dezembro 2018

. Novembro 2018

. Outubro 2018

. Setembro 2018

. Agosto 2018

. Julho 2018

. Junho 2018

. Maio 2018

. Abril 2018

. Março 2018

. Fevereiro 2018

. Janeiro 2018

. Dezembro 2017

. Novembro 2017

. Outubro 2017

. Setembro 2017

. Agosto 2017

. Julho 2017

. Junho 2017

. Maio 2017

. Abril 2017

. Março 2017

. Fevereiro 2017

. Janeiro 2017

. Dezembro 2016

. Novembro 2016

. Outubro 2016

. Setembro 2016

. Agosto 2016

. Julho 2016

. Junho 2016

. Maio 2016

. Abril 2016

. Março 2016

. Fevereiro 2016

. Janeiro 2016

. Dezembro 2015

. Novembro 2015

. Outubro 2015

. Setembro 2015

. Agosto 2015

. Julho 2015

. Junho 2015

. Maio 2015

. Abril 2015

. Março 2015

. Fevereiro 2015

. Janeiro 2015

. Dezembro 2014

. Novembro 2014

. Outubro 2014

. Setembro 2014

. Agosto 2014

. Julho 2014

. Junho 2014

. Maio 2014

. Abril 2014

. Março 2014

. Fevereiro 2014

. Janeiro 2014

. Dezembro 2013

. Novembro 2013

. Outubro 2013

. Setembro 2013

. Agosto 2013

. Julho 2013

. Junho 2013

. Maio 2013

. Abril 2013

. Março 2013

. Fevereiro 2013

. Janeiro 2013

. Dezembro 2012

. Novembro 2012

. Outubro 2012

. Setembro 2012

. Agosto 2012

. Julho 2012

. Junho 2012

. Maio 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Fevereiro 2012

. Janeiro 2012

. Dezembro 2011

. Novembro 2011

. Outubro 2011

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Março 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Dezembro 2009

. Novembro 2009

. Outubro 2009

. Setembro 2009

. Agosto 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Maio 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Janeiro 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Setembro 2008

. Agosto 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

. Maio 2008

. Abril 2008

. Março 2008

. Fevereiro 2008

. Janeiro 2008

. Dezembro 2007

. Outubro 2007

. Setembro 2007

. Agosto 2007

. Julho 2007

. Junho 2007

. Maio 2007

. Março 2007

. Fevereiro 2007

.favoritos

. Feliz Natal

.links

.tags

. todas as tags

SAPO Blogs
RSS
Em destaque no SAPO Blogs
pub